Apesar dos vetos, pontos polêmicos do PL 2159/2021 aprovados no Congresso foram mantidos. É o caso da Licença Ambiental Especial (LAE), que além de permanecer sem veto presidencial, ganhou uma Medida Provisória que antecipa sua vigência.

O presidente Lula sancionou na última sexta-feira (8/8), com 63 vetos, a Lei Geral do Licenciamento Ambiental aprovada pelo Congresso no mês passado. Os apelos por veto integral ao chamado “PL da Devastação”, solicitados por organizações socioambientais e com significativa mobilização da sociedade civil, não prosperaram como o desejado. Na decisão final, Lula vetou 63 dos quase 400 dispositivos aprovados pelos parlamentares.

Apesar dos vetos, o governo federal deu sinal verde imediato para a implantação da Licença Ambiental Especial (LAE). A medida acelera o licenciamento de obras e empreendimentos considerados estratégicos pelo Conselho de Governo, com prioridade sobre outros processos e equipes dedicadas para sua análise.

Originalmente, essa licença só entraria em vigor em seis meses. Mas uma Medida Provisória assinada pela Presidência da República garante que ela passe a valer imediatamente.

A proposta da LAE foi incluída de última hora no projeto de lei pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). A licença especial pode beneficiar projetos polêmicos, como a exploração de petróleo na foz do Rio Amazonas, além de empreendimentos de mineração ligados à transição energética.

O anúncio dos vetos foi feito no Palácio do Planalto sem a presença de Lula, que estava em viagem ao Acre. A cerimônia contou com a participação da ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, a secretária-executiva da Casa Civil, Miriam Belchior, e o ministro da Secretaria de Comunicação,

Sidônio Palmeira.  

Os ministros Sidônio Palmeira (Secretaria de Comunicação) e Marina Silva (Meio Ambiente) e a secretária-executiva da Casa Civil, Míriam Belchior, na coletiva de imprensa no Palácio do Planalto em que foram anunciados os vetos (Foto: Henrique Raynal / Casa Civil)

Segundo Belchior, os vetos buscam garantir segurança jurídica e proteção ambiental ao país. Além das 63 suspensões do PL 2159/2021, o governo enviará aos parlamentares um projeto de lei com urgência constitucional que repõe questões importantes que, com os vetos, trariam vácuos na legislação. “A gente está mandando um projeto de lei de urgência constitucional que repõe parte dos vetos, o que nos parece um movimento importante de diálogo com o Congresso Nacional. Queremos continuar dialogando nesses temas”, afirmou secretária-executiva da Casa Civil.

Marina Silva explicou que os vetos envolveram um trabalho “minucioso”, em parceria com a Casa Civil, a comunidade científica e o Congresso Nacional.  “Não basta apenas vetar. Era preciso criar um mecanismo para repor, seja na forma de uma redação complementar ou um texto novo, que dialogasse com a intenção [do projeto original], mas dando a tipificação em termos mais adequados, tanto para a segurança jurídica quanto para a proteção e o processo de agilização do licenciamento”, ressaltou a ministra.

O que disseram as organizações da sociedade civil

Para organizações da sociedade civil, os vetos são bem-vindos, mas é preciso aguardar a publicação oficial das medidas adotadas pelo governo para uma avaliação mais precisa.

“Considerando a coletiva de imprensa do governo, os vetos aparentemente enfrentam os principais problemas do PL da Devastação e protegem o meio ambiente e a segurança das pessoas. Como o ideal seria o veto integral, é necessário analisar com detalhes os textos que serão publicados pelo governo nas próximas horas para uma posição definitiva”, afirma Maurício Guetta, Diretor de Direito e Políticas Públicas da Avaaz.

Para Gabriela Nepomuceno, especialista de Políticas Públicas do Greenpeace Brasil, “a decisão do governo é uma vitória da mobilização social, como respeito à vontade popular”. “Convocamos o Congresso Nacional, nessa nova chance, a honrar sua responsabilidade, priorizar a proteção de vidas e ecossistemas no apoio aos vetos presidenciais e conduzir um debate qualificado centrado no interesse público, acima de pressões setoriais”, diz.

Para Márcio Astrini, do Observatório do Clima, “o governo mandou uma mensagem clara, de que se debruçou sobre o tema e discordou do que veio do Congresso”. “Mas esse é um veto em quatro atos: a coletiva, que aconteceu; a publicação dos vetos em si; um projeto de lei; e mais uma medida provisória. Por enquanto, a gente só tem um desses atos. Pra termos uma análise do todo, da extensão, da profundidade desses vetos, a gente vai precisar ver todos os textos”, pondera.

Veja quais são os principais vetos ao “PL da Devastação”

Licença Ambiental Especial (LAE) – a nova redação proposta assegura que a LAE terá um rito acelerado, com um prazo para sua conclusão de até um ano, após a apresentação do Estudo e Relatório de Impacto Ambiental (Eia-Rima). Por outro lado, o processo não poderá ser realizado obrigatoriamente em uma etapa, conforme a redação aprovada pelo Legislativo, mas será definido pelo órgão ambiental. 

Licença por Adesão e Compromisso (LAC) – se aplica apenas para empreendimentos de baixo potencial poluidor. Foi vetada a ampliação para atividades de médio potencial poluidor.

Estados e municípios – foram vetados dispositivos que transferiam de forma ampla a cada ente federado a responsabilidade por estabelecer critérios e procedimentos de licenciamento — como porte, potencial poluidor, tipologias sujeitas a licenciamento, modalidades específicas de licenças e atividades passíveis de LAC. Com a redação do governo, terão de seguir parâmetros mínimos nacionais.

Mata Atlântica – foram vetados os dispositivos que retirariam a proteção especial prevista na Lei da Mata Atlântica em relação à supressão de floresta nativa.

Povos indígenas e comunidades quilombolas – foram vetados os dispositivos que restringiam a participação dos órgãos responsáveis pela proteção de povos indígenas e comunidades quilombolas no licenciamento ambiental, bem como não vinculava a sua manifestação ao resultado. Também foram vetados os itens que excluíam das análises e medidas previstas no licenciamento as terras indígenas (TIs) e os territórios quilombolas cuja regularização não esteja concluída. Pela nova redação, enviada ao Congresso, as TIs com limites territoriais já propostos e os quilombos já certificados pela Fundação Cultural Palmares deverão ser levados em conta nos procedimentos.

Cadastro Ambiental Rural (CAR) – vetada a proposta que dispensa o licenciamento ambiental para produtores rurais com CAR ainda pendente de análise pelos órgãos ambientais estaduais. Será necessária a análise do cadastro ou a elaboração de um termo de conduta com o produtor rural.

Condicionantes ambientais – foi vetado dispositivo que limitava a aplicação de condicionantes ambientais e medidas compensatórias apenas aos impactos diretos, excluindo os impactos indiretos ou os efeitos sobre serviços públicos agravados pela implantação do empreendimento. As condicionantes, no entanto, precisarão ter uma relação “direta” com o dano ambiental.

Unidades de Conservação – vetado artigo que retirava o caráter vinculante de manifestação de órgãos gestores dessas áreas no licenciamento de empreendimentos que afetem diretamente a unidade ou sua zona de amortecimento

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Com informações da agência Pública

Foto de capa:  Enrico Marone/Greenpeace