Discurso de Merz sobre jornalistas ‘felizes’ por deixar Belém foi criticado por autoridades e pela sociedade civil
Por Eraldo Paulino
Viralizou nas redes sociais uma declaração em que o chanceler alemão, Friedrich Merz, diz que jornalistas que o acompanharam ao Brasil para a COP30 teriam ficado contentes em deixar Belém e retornar à Alemanha. O discurso foi proferido durante o Congresso Alemão do Comércio, em 13 de novembro, mas ganhou força nas últimas 24 horas, gerando ampla reação nas redes sociais, com manifestações de políticos, influenciadores e internautas.
“Senhoras e senhores, nós vivemos em um dos países mais bonitos do mundo. Perguntei a alguns jornalistas que estiveram comigo no Brasil na semana passada: ‘Quem de vocês gostaria de ficar aqui?’ Ninguém levantou a mão. Todos ficaram contentes por termos retornado à Alemanha, na noite de sexta para sábado, especialmente daquele lugar onde estávamos”, disse Merz.
Político conservador da União Democrática Cristã, Merz ocupa desde maio o cargo de chanceler — equivalente ao de primeiro-ministro. Ele esteve em Belém para participar da Cúpula dos Líderes, realizada nos dias 6 e 7 de novembro, antes da COP30. Após a viralização do vídeo, sua fala foi classificada como “arrogante” pelo prefeito de Belém, Igor Normando (MDB).
“Cada um dá o que tem e, infelizmente, o chanceler alemão destila preconceito e arrogância na sua fala — bem diferente do seu povo, que demonstra nas ruas de Belém o encantamento pela nossa cidade. Chanceler, nós continuaremos tratando com respeito e alegria todos que nos visitam; afinal, é o que temos de melhor”, escreveu Normando em uma rede social.
O governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), também se manifestou e classificou o discurso como “preconceituoso”.
“O Pará abriu as portas e mostrou a força de um povo acolhedor. Curioso ver quem ajudou a aquecer o planeta estranhar o calor da Amazônia. Um discurso preconceituoso revela mais sobre quem fala do que sobre quem é falado”, declarou o emedebista.
Até o momento, o Itamaraty não se pronunciou sobre a declaração de Merz.
A influenciadora alemã Lea Maria, conhecida por seus vídeos bem-humorados sobre a experiência de morar no Brasil, afirmou ter sentido vergonha alheia, mas não surpresa, alegando que Merz já teria dado declarações xenofóbicas anteriormente.
“Às vezes a gente não sabe… às vezes a pessoa tem demência e não entende que está falando publicamente em um parlamento alemão, e não no bar com seus amigos de 120 anos, que ainda têm parentes na Argentina”, ironizou Lea, em referência a nazistas que se refugiaram na América do Sul após a Segunda Guerra Mundial, e que teriam lugar à mesa da autoridade alemã.
Crise climática em segundo plano
Desde que problemas estruturais de Belém enquanto sede da COP30 vieram à tona, o debate sobre a crise climática muitas vezes ficou em segundo plano, cedendo espaço a disputas de narrativa sobre qual cidade brasileira teria legitimidade para acolher o evento. A fala de Merz reacendeu as críticas e passou a ser usada inclusive por setores da direita para atacar a conferência e a pauta climática.
Ainda assim, a reação predominante foi de repúdio ao discurso, considerado preconceituoso, deselegante e infeliz.
“Me sinto um pouco triste. Não sei o porquê dessa reação, sendo que a gente é um povo acolhedor, um povo amigável. Num ambiente que deveria ser diplomático, fica uma situação complicada quando um político vai para fora e faz esse tipo de provocação”, comentou a revisora de textos Ana Paula. “Que bom que voltaram para o país deles”, desabafou a servidora pública Alexandra Martins. Ambas são paraenses.
A Alemanha, que está entre os países com maior responsabilidade histórica pelo aquecimento global, expressou apoio ao Fundo Florestas Tropicais Para Sempre (TFFF, na sigla em inglês). Embora não tenha divulgado valores, afirmou que pretende investir uma quantia significativa no fundo.
*Com colaboração de Mariana Castro
Edição: Geisa Marques
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Foto de capa: Tobias Schwarz / AFP
Conteúdo publicado originalmente pela Brasil de Fato e cedido para a publicação na agência Carta Amazônia.
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