Povos da floresta e da cidade fazem da COP do Povo um canto de resistência e esperança.
Por Eraldo Paulino
Em busca de protagonismo nas decisões sobre o clima e o futuro da Amazônia, 39 organizações formaram a COP do Povo, uma aliança de lideranças indígenas, quilombolas e movimentos populares do Brasil e de outros países da América Latina. O evento ocorre até o dia 21 de novembro, paralelamente à COP30, na Casa do Povo, localizada no bairro do Reduto, em Belém (PA), reunindo vozes e propostas para fortalecer a participação popular nas discussões sobre justiça climática e garantir que as comunidades da floresta sejam ouvidas.
A iniciativa é resultado da união de lideranças de territórios tradicionais, associações e coletivos populares que reivindicam um espaço legítimo nas mesas de decisão das conferências da ONU.
Em carta assinada por todos os integrantes, as comunidades da Amazônia afirmam que, assim como em outros momentos da história, continuam sendo ignoradas na construção da conferência oficial. O documento defende que o verdadeiro legado da COP precisa estar nas reformas agrária e popular, na demarcação de terras indígenas e quilombolas e na proteção das unidades de conservação, não na expansão de obras e negócios que excluem os povos da floresta.
Segundo Izi Azevedo, comunicadora do Instituto Zé Cláudio e Maria — uma das entidades organizadoras —, o espaço é um convite à escuta e à resistência. “Aqui surgiu como uma ideia das pessoas terem voz — as comunidades tradicionais, os movimentos de base. É um espaço onde você pode chegar e falar, ser ouvido, se comunicar. Aqui, a gente é resistência”, afirma.
Entre os principais objetivos do movimento está reforçar o debate sobre justiça socioambiental e a proteção de defensores ambientais. Para Clara Santos, sobrinha do casal José Cláudio e Maria do Espírito Santo, lideranças assassinadas em 2011 no Pará, a criação da COP do Povo também é um ato de memória e continuidade.
“Esse instituto só existe porque o casal foi assassinado em 2011. Nós, familiares, seguimos ameaçados diariamente. A nossa luta é pra que as pessoas possam ter acesso à terra, defender seu território, viver onde ainda existe floresta. Isso é um dos maiores desafios que enfrentamos”, destaca.
As denúncias sobre a violência nos territórios amazônicos e a destruição ambiental também estão no centro das falas das lideranças presentes. Ileia Munduruku, do povo Munduruku do Médio Tapajós, relata a contaminação e o sofrimento de seu povo diante do avanço do garimpo e do desmatamento.
“O nosso rio está poluído, nossos peixes também. A gente está contaminado pelo mercúrio. Dele vem o alimento, o material pra artesanato, tudo o que sustenta nossas famílias. Por isso, a gente defende nossos territórios”, afirma.
Além de um espaço de denúncia e articulação política, a COP do Povo também se propõe a ser um lugar de afeto, escuta e cuidado. A defensora de direitos humanos Ana Silva, do coletivo Mulheres Negras Decidem, reforça a importância de cuidar de quem está na linha de frente.
“Os defensores de direitos humanos vivenciam as violências e os lutos de forma muito intensa. Estar aqui é uma forma de recarregar as energias, de cuidar de quem cuida. É também uma forma de seguir lutando”, diz.
Inspirada na memória de Zé Cláudio e Maria, a COP do Povo se estrutura como uma cadeia de ações permanentes, com destaque para a criação do Tribunal do Povo, que julgará simbolicamente as empresas e governos que violam direitos humanos e ambientais na Amazônia.
O movimento reforça que não há justiça climática sem justiça social, agrária e ambiental, e que a verdadeira resposta à crise climática vem das práticas coletivas, solidárias e ancestrais dos povos da floresta que resistem e mantêm o planeta vivo.
Editado por: Maria Teresa Cruz
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Foto de capa: Eraldo Paulino/ Carta Amazônia
Conteúdo publicado originalmente pela Brasil de Fato e cedido para a publicação na agência Carta Amazônia.
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