ONGS promovem formações que capacitam as juventudes para maior envolvimento com as questões climáticas

Por Ana Vitória Gouvêa

A crise climática na Amazônia é o tema central das discussões pré-COP 30. O ano em que o Brasil e o mundo batem recordes de aumento da temperatura também é marcado pelo aniversário de 10 anos do fim das pororocas amazônicas e pelo maior recorde de dias sem chuvas em Belém.

Na região metropolitana de Belém, organizações não governamentais se mobilizam para educar e fomentar uma educação climática em comunidades escolares de escolas públicas de bairros periféricos. O projeto “Escolas Climáticas”, uma parceria da Mandí e do Laboratório da Cidade, busca, por meio da capacitação de alunos e professores, promover discussões sobre urbanização e resiliência ambiental na cidade.

A iniciativa visa aumentar a conscientização e o engajamento entre a comunidade escolar, incentivando-os a se tornarem agentes ativos na promoção de práticas sustentáveis e protagonistas na busca de soluções para problemas climáticos. Essa atividade também é uma forma de trazer o debate climático para uma Amazônia frequentemente ignorada e esquecida. Nessas atividades, utiliza-se a metodologia das bacias escolas, onde os rios se tornam verdadeiras salas de aula.

Para Alan Batista, assessor de educação da Mandí, a metodologia das bacias escolas é uma tentativa de romper com a padronização que existe na educação climática. Na expedição aos rios, os alunos conseguem ter um contato mais real com problemas que já conhecem, mas que não sabem ou não pensaram ainda como resolver.

“Neste projeto, conseguimos aproximar os alunos de uma percepção que eles já têm, porque vivem nesses locais [da expedição]. Tentamos fornecer as ferramentas práticas para que consigam expressar seus questionamentos e indignações”, explica Alan.

Nos meses de setembro e outubro, os alunos do ensino médio técnico da EETEPA Vilhena Alves tiveram a oportunidade de participar de três encontros: dois de formação e um de expedição ao rio Tucunduba. Nesses encontros, discutiram e debateram sobre mudanças e a emergência climática, propondo ideias e soluções para um problema que já é bem conhecido por eles. Foi nesses encontros que tiveram a oportunidade de visitar a nascente do rio — que fica em uma propriedade particular — e a foz, na Universidade Federal do Pará.

Alunos do projeto “Escolas Climáticas” em visIta a foz do rio Tucunduba, no campus da UFPA. em Belém (Foto: Dalissa Cabral/Mandí)

A coordenadora de projetos da escola, Alessandra Lima, explica que esse momento é muito significativo para os alunos, já que, apesar de muitos morarem nas redondezas da universidade, poucos a frequentam ou sabiam que a foz do rio era ali. Para Alessandra, a finalização do projeto na universidade representa um futuro.

“Eu chego até a me emocionar porque sei que estudar e ocupar esse espaço é um dos principais sonhos dessa meninada. Poder vê-los ali, encantados, depois de uma manhã inteira de discussões muito importantes sobre a questão climática que os afeta diretamente, sonhando com o dia em que estarão ali como alunos do ensino superior… realmente é uma experiência muito gratificante para mim, como educadora, principalmente”, diz ela.

Projeto promove discussões sobre urbanização e resiliência ambiental na região metropolitana de Belém (Foto: Dalissa Cabral/Mandí)

Juventudes em pauta

Segundo uma pesquisa da Unicef-Gallup, apenas metade dos jovens entre 15 e 24 anos compreende de fato o que são mudanças climáticas, e é essa nova geração que será a mais afetada por essas mudanças: pesquisadores brasileiros estimam que o colapso da Amazônia se dará em 20 anos. Neste momento tão crucial, pensar na educação climática das juventudes é a principal estratégia de diversos agentes que combatem a emergência climática.

Para Julyane Moraes, aluna do segundo ano do curso Técnico em Meio Ambiente da escola Vilhena Alves, essa perspectiva é muito assustadora. “A gente ouve muito dos nossos pais e avós que as coisas mudaram, mas é só quando a gente vê de perto que realmente sente, né? Porque há 20, 30 anos, eles podiam tomar banho nos rios, podiam pescar, e hoje em dia a gente não consegue ver mais isso. É só lixo e fedor”, desabafa.

Estudar as mudanças climáticas na idade dela trouxe uma nova perspectiva sobre tudo que ela vive, seja na escola ou na rua. Ela afirma que não há mais uma separação explícita entre o que é o problema do meio ambiente e o que é o problema humano. Na cidade das Mangueiras, Julyane diz que o que mais sente é calor. “Antes de estudar aqui e de ter essa vivência no Escolas Climáticas, a gente tinha a impressão de que tudo era muito separado. Mas agora, eu vejo que até o calor que sinto no ônibus para chegar à escola tem a ver com isso.”

Ter essa reflexão abrangente é justamente o objetivo das formações. Segundo Lígia Nassar, diretora executiva do Laboratório da Cidade, pensar as mudanças climáticas a partir da perspectiva de suas próprias comunidades ajuda os jovens a desenvolverem soluções viáveis e adequadas para aquelas vivências específicas que só membros da comunidade entenderiam.

“O Labclima e o Escolas Climáticas são duas faces da mesma moeda: a gente pensa em rios, pensa em urbanismo, resiliência climática, mas a partir da vivência dessas comunidades. Porque o que nós queremos é que os jovens saiam daqui não só com essa educação, mas com a perspectiva de que ainda dá para mudar as coisas e que eles podem ser agentes ativos nesse processo”, explica ela.

Essa tarefa de educar as juventudes não é unilateral. Os professores desses alunos também estão envolvidos em formações que podem ajudá-los a aplicar a metodologia e pensar em metodologias mais ativas para a sala de aula, tornando o conteúdo educacional mais próximo da realidade desses alunos. “O que a gente vê nas diretrizes do MEC é que há uma grande padronização do ensino ambiental. No entanto, precisamos pensar nas particularidades de cada território. O que é necessário para a Amazônia talvez não seja para o Cerrado e vice-versa”, explica Alan Batista, assessor de educação da Mandí.

A professora Alessandra Lima concorda. Para ela, a parte mais importante da educação climática é justamente os alunos conseguirem pensar a partir de seus contextos. “Isso torna o problema muito mais relacionável, sabe? Não é mais uma coisa abstrata que a gente vê na TV ou lê na internet. Eles conseguem pensar que aquele lixo que o vizinho joga de forma inadequada é uma ação que impacta diretamente o clima. Isso também torna mais fácil para pensarem em soluções locais que tenham esse impacto global.”

Preparação para a COP-30

A grande expectativa para o ano de 2025 é a realização da Conferência das Nações Unidas para o Clima. 2024 foi um ano de extremos para a Amazônia, que enfrentou aumento nas queimadas, seca extrema nos rios e um aumento considerável da exploração madeireira ilegal. Por isso, a COP 30 representa uma oportunidade única para que os jovens se conectem com representantes globais e compartilhem suas experiências e preocupações.

Para Alan e Lígia, a participação ativa desses estudantes nas discussões sobre políticas climáticas é essencial para garantir que suas perspectivas sejam consideradas na formulação de soluções. “É uma juventude engajada e bem informada que pode mudar alguma coisa”, conclui Alan.

A realização da COP sobre o clima em Belém adiciona uma nova perspectiva sobre como é possível pensar a região Amazônica: como uma área onde grandes decisões são tomadas e onde a população tem participação ativa nas discussões que lhes interessam.

“As ações do Laboratório da Cidade irão culminar na COP 30. A gente pensa também lá na frente na questão da empregabilidade, porque queremos que esses jovens sejam capacitados para empregos verdes. Nós queremos mantê-los engajados e próximos do assunto, justamente para poderem participar ativamente desse processo que ocorrerá no próximo ano”, explica Lígia.

A esperança de uma juventude engajada e tomadora de decisões é o que move os sonhos de Julyane. Para ela, seus sonhos só vão se realizar em uma realidade em que as mudanças climáticas sejam pensadas para as pessoas que realmente são impactadas por elas.

“O que mais estamos vendo agora, nesse ano que é um ano eleitoral, é que muitos políticos estão falando sobre meio ambiente. Mas acho importante nos questionarmos quem são esses políticos, o que pensam e o que propõem que faça sentido para o nosso contexto, porque não adianta nada só falar e não fazer. A gente também tem que cobrar, estar lá, e essa capacitação me ajudou muito a perceber isso. Mas eu acho que é possível, sim, sonhar com esse mundo. É o que nos dá esperança, né? De que as coisas vão melhorar.”

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Foto de capa: Dalissa Cabral/Mandí