OPINIÃO

Por Adison Ferreira

Durante muitos e muitos anos a história e as narrativas do Brasil foram pautadas exclusivamente a partir do olhar do colonizador. Desde os primeiros anos da escola nos ensinaram que foi graças aos europeus que fomos “descobertos”, catequizados, “civilizados” e uma série de adjetivos com a função de silenciar e violentar os saberes e o modo de vida africano e dos povos originários.

Esse cenário de epistemicídio tem mudado nos últimos anos à custa de muita luta, resistência e resiliência dos movimentos negro e indígena do país. Mas ainda há muitos desafios pela frente. Afinal, descolonizar o pensamento consiste em rever a hegemonia e a estrutura da crença incondicional dos saberes produzidos pela Europa, que tentaram a todo custo desqualificar e exterminar os saberes ancestrais dos povos colonizados.

O enfrentamento aos efeitos negativos do discurso colonial precisa ser fortalecido nos mais diversos espaços da sociedade. Família, escola, comunidade e o local de trabalho devem e precisam ser ambientes de questionamento à lógica estrutural de opressão e apagamento dos saberes tradicionais.

Empresas que afirmam adotar as práticas ESG (Environmental, Social and Governance) e não respeitam os modos de vida dos povos indígenas e comunidades quilombolas não fazem ESG. O nome disso é greenwashing, um procedimento feito para enganar consumidores com selos falsos e uma imagem de responsabilidade socioambiental que não condiz com a prática da organização. Um ode ao discurso colonial!

Na Amazônia, infelizmente, existem muitos exemplos assim. Empresas que atuam com comunidades tradicionais com o mesmo modus operandi de 500 anos atrás. Organizações que fingem promover iniciativas de fortalecimento local, mas sem ouvir nenhuma liderança comunitária. Projetos de “responsabilidade socioambiental” formados exclusivamente por equipes estrangeiras ao território. Ações de “práticas sustentáveis” que tratam a natureza apenas como lucro e mercadoria.

Apesar de ser tão criminoso e nocivo quanto o processo de escravização de negros e indígenas no Brasil, o modelo de greenwashing segue firme, forte e impune na Amazônia, em pleno 2023, em pleno cenário de crise climática. É a reinvenção da colonização exploratória, que precisa ser combatida pelo poder público e por empresas que adotam, de fato, as práticas de ESG.

Descolonizar o pensamento também é compreender a importância da ancestralidade negra e indígena para conservação do meio ambiente. Afinal, não existe prática de ESG e nem ação de responsabilidade socioambiental, de verdade, sem o protagonismo das comunidades tradicionais. Como afirma o mestre indígena Ailton Krenak, são elas que nos ajudam a adiar o fim do mundo.

______________________________________

Foto: Freepik/ Acervo 2023