Ao longo de seus mandatos na Câmara dos Deputados, o parlamentar e atual candidato à Prefeitura de Belém, tem apoiado diversas iniciativas que flexibilizam direitos sociais e regulamentações ambientais no país
Por Daniel Vinagre
Em uma recente entrevista à TV Liberal, afiliada da Rede Globo no Pará, o candidato à Prefeitura de Belém, Éder Mauro (PL), declarou que não é contra as pautas ambientais e que não “existe nenhuma alegação por escrito” de que ele seja contra essas pautas. No entanto, em uma apuração, foram encontradas diversas votações de projetos de lei e medidas provisórias que vão contra as agendas ambientais.
Éder Mauro (PL-PA), que atua como um dos principais expoentes da extrema direita no Pará, tem sua trajetória política fortemente ancorada em pautas ligadas à segurança pública e ao combate ao crime. Como ex-delegado da Polícia Civil, Mauro construiu sua imagem pública com base em uma retórica de enfrentamento à violência, conquistando eleitores por meio de um discurso que promove o endurecimento das leis penais e defende a ação ostensiva das forças de segurança. No entanto, sua atuação parlamentar não se limita a essa esfera. Ao longo de seus mandatos na Câmara dos Deputados, o parlamentar tem se posicionado em outras frentes legislativas, principalmente em temas relacionados ao meio ambiente, direitos humanos e proteção das populações tradicionais, muitas vezes adotando posições que geram controvérsias.
Um dos principais pontos de crítica à sua atuação está relacionado às questões ambientais. Em 2019, Éder Mauro votou a favor do Projeto de Lei 2633/2020, amplamente conhecido como o “PL da Grilagem”. Esse projeto, que flexibiliza as regras para a regularização fundiária de terras ocupadas ilegalmente, principalmente na Amazônia, foi criticado por organizações ambientalistas, que alertaram para o risco de estímulo ao desmatamento e à ocupação irregular de áreas públicas. O Instituto Socioambiental (ISA), por exemplo, destacou que o PL poderia ampliar a destruição da floresta ao facilitar a legitimação de invasões em áreas protegidas, como terras indígenas e unidades de conservação. Em defesa de seu voto, o deputado argumentou que a proposta visava dar “segurança jurídica ao produtor rural”, além de promover o desenvolvimento econômico em áreas rurais que, segundo ele, enfrentam dificuldades com a regularização fundiária.
Além do “PL da Grilagem”, Éder Mauro também apoiou outras iniciativas que afrouxam as regulamentações ambientais, como o Projeto de Lei 3729/2004, que flexibiliza as normas de licenciamento ambiental. Em suas declarações, Mauro sustenta que esse tipo de flexibilização é necessário para “desburocratizar” processos que, em sua visão, atrapalham o desenvolvimento econômico do país. Ele frequentemente utiliza o argumento de que a proteção ambiental, quando associada a regulamentações rígidas, inibe investimentos e a criação de empregos, sobretudo no setor agropecuário. Contudo, críticos afirmam que tais medidas favorecem grandes empresas e grileiros, enquanto colocam em risco biomas como a Amazônia. De acordo com o Observatório do Clima, a aprovação de legislações mais permissivas tem contribuído diretamente para o aumento do desmatamento e das queimadas ilegais na região.
Outra área em que as posições de Éder Mauro geram fortes debates é a questão indígena. O deputado votou a favor do polêmico Projeto de Lei 490/2007, que altera as regras de demarcação de terras indígenas no Brasil. O PL estabelece que só poderão ser demarcadas as terras que estavam sob posse dos povos indígenas na data da promulgação da Constituição de 1988, o chamado “marco temporal”. Essa proposta, amplamente rejeitada por comunidades indígenas e movimentos de defesa de direitos humanos, foi considerada um retrocesso nos direitos dos povos originários. A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) classificou o projeto como “um ataque aos direitos constitucionais” e alertou que, se aprovado, dificultaria a criação de novas terras indígenas e facilitaria a exploração econômica de áreas tradicionais. Éder Mauro, por sua vez, defendeu o PL alegando que era uma forma de “pôr fim aos conflitos fundiários” e que muitos pedidos de demarcação, segundo ele, são infundados e prejudicam o desenvolvimento do agronegócio.
Além de sua atuação legislativa, Mauro tem sido uma figura central em embates políticos polarizados, principalmente no que diz respeito às pautas de direitos humanos. Ele foi amplamente criticado por seu voto contra o PL 6726/2013, que estabelece o combate ao trabalho escravo. O projeto reforça a definição de trabalho escravo contemporâneo e endurece as punições para empregadores que mantêm trabalhadores em condições análogas à escravidão. Apesar do consenso sobre a gravidade da questão no Brasil, especialmente no setor rural, onde muitas denúncias surgem, Mauro alegou que a legislação seria “excessivamente punitiva” e que prejudicaria pequenos produtores, além de questionar os critérios utilizados para classificar o que configura trabalho escravo, sugerindo que esses critérios poderiam ser usados de forma injusta.
Ao longo de sua carreira, o deputado também tem votado consistentemente contra projetos de proteção social e de direitos de minorias. Em 2019, ele se posicionou contra a PEC 438/2018, que visava destinar mais recursos para a preservação ambiental no Brasil, alegando que as prioridades do país deveriam estar em outras áreas, como saúde e segurança. Mais recentemente, em 2021, Éder Mauro votou contra a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), sob o argumento de que a legislação traria um “excesso de controle” sobre as atividades empresariais, mesmo com a proposta sendo amplamente considerada um avanço na proteção dos direitos de privacidade dos cidadãos.
Seu estilo combativo e de discurso direto faz com que Éder Mauro seja uma figura popular entre setores mais conservadores da população, que veem nele um representante fiel de seus interesses, especialmente nas áreas de segurança e combate à criminalidade. No entanto, esse mesmo estilo e suas posições políticas frequentemente o colocam em rota de colisão com organizações da sociedade civil, movimentos sociais e ativistas ambientais. A polarização em torno de sua figura ilustra bem a divisão no cenário político atual, onde temas como desenvolvimento econômico, preservação ambiental e direitos das populações tradicionais são fontes constantes de conflito.
Acompanhe abaixo as 17 votações em que Éder Mauro foi contrário a pautas relacionadas a direitos trabalhistas, previdenciários e ambientais, conforme as entidades consultadas pela reportagem:
O PL 2058/2021 defendeu o retorno ao trabalho presencial para grávidas vacinadas ou não vacinadas, apesar do risco elevado pela Covid-19. A avaliação do voto sim foi favorável, enquanto a do voto não/obstrução foi desfavorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 191/2020 (REQ 227/2022) propôs regulamentação de atividades econômicas em terras indígenas, com a avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, também resultando em uma votação negativa.
O PL 1304/2020 envolveu a transferência de terras da União para Roraima e Amapá para regularização fundiária, com emenda que protegia territórios quilombolas rejeitada. A avaliação do voto sim foi desfavorável, enquanto a do voto não/obstrução foi favorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 3715/2019 autorizou posse de armas em imóveis rurais, aumentando a violência no campo. A avaliação do voto sim foi favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 3729/2004 dispensou licenciamento ambiental de várias atividades com potencial impacto ambiental, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 6299/2002 facilitou o registro de agrotóxicos, permitindo a venda de substâncias cancerígenas. A avaliação do voto sim foi favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 5191/2020 criou fundos imobiliários rurais, permitindo a compra de terras por estrangeiros, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
O PL 1100/2021 concedeu isenção de Imposto de Renda e facilitou o acesso ao INSS para sobreviventes da Covid-19 com sequelas, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A PEC 6/2019 dificultou a obtenção de aposentadoria e reduziu benefícios do INSS, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 881/2019 retirou direitos do trabalhador e enfraqueceu a fiscalização trabalhista, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 1061/2021 criou o Auxílio Brasil, mas exigiu doação de alimentos pelos agricultores familiares, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 1027/2021 autorizou a Funai a criar barreiras sanitárias em áreas indígenas, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 897/2019 ampliou a concessão de crédito para o agronegócio, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 905/2019 criou o Contrato Verde e Amarelo, facilitando a contratação de jovens com menos direitos, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 936/2020 permitiu a suspensão e redução temporária de contratos durante a pandemia, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
A MPV 927/2020 instaurou o trabalho remoto e outras medidas durante a pandemia, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
Por fim, a MPV 1023/2020, que dificultou o acesso ao Benefício de Prestação Continuada – BPC, reduzindo a renda máxima, com avaliação do voto sim favorável e do voto não/obstrução desfavorável, resultando em uma votação negativa.
Fontes:
Agência Câmara de Notícias
Repórter Brasil
Observatório do Clima
Instituto Socioambiental (ISA)
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB)
DW Brasil
Sede da COP-30, Belém tem candidato que espalha negacionismo climático | Aos Fatos
COP30 e mudanças climáticas ficam em segundo plano na eleição de Belém | Band
https://climainfo.org.br/2024/07/02/candidato-bolsonarista-a-prefeitura-de-belem-questiona-cop30/
https://ruralometro2022.reporterbrasil.org.br/politicos/delegado-eder-mauro
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Foto de capa: Zeca Ribeiros/Agência Câmara