Lideranças indígenas do povo Tembé foram baleadas na manhã desta segunda-feira (07), no município de Tomé-Açu, nordeste do Pará, durante os preparativos para o recebimento da visita do Conselho Nacional de Direitos Humanos na cidade. Segundo os indígenas, quatro lideranças foram atingidas por tiros  disparados por seguranças privados da empresa Brasil BioFuels – BBF. Uma das vítimas afirma em áudio que foi alvejada por tiros no ombro e na coxa.

Uma nota pública assinada pela Associação Indígena Tembé de Tomé-Açu, em parceria com a Associação Indígena Turiwara do Braço Grande, Comissão Pastoral da Terra e diversas entidades de defesa dos Direitos Humanos, divulgou detalhes do atentado e afirmou que a liderança Daiane Tembé foi a principal alvo do crime. A indígena foi atingida no pescoço e no maxilar. Segundo a nota, a vítima foi levada para Belém por meio da UTI aérea. Os outros indígenas baleados receberam atendimentos médicos no local.

Imagens da área administrativa do empresa, em Tomé-Açu, onde ocorreu o baleamento (Foto: circuito interno/Grupo BBF)

Este é o segundo caso de atentado cometidos contra o povo Tembé, em menos de dois dias, no Pará. Na última sexta-feira (04),  outro indígena da mesma etnia foi alvejado entre as pernas por um vigilante de uma empresa particular também no município de Tomé-Açu. Socorrida, a vítima foi encaminhada para Belém, onde foi submetida a tratamento médico.

A nota  da Associação Indígena Tembé chama a atenção para o fato de os crimes terem ocorrido a cerca 200 km de distância da capital paraense, sede do epicentro global de debates sobre mudanças climáticas e alternativas para a proteção de povos e comunidades tradicionais na Amazônia. O primeiro atentado aconteceu no mesmo período do “Diálogos Amazônicos”,  realizado nos dias 04 a 06 de agosto, em Belém.  Este segundo, na véspera da “Cúpula da Amazônia”, programada para os dias 08 e 09 de agosto, também na capital, e que reunirá  presidenciáveis e autoridades da Pan-amazônia para discutir agenda climática e a pauta socioambiental da Amazônia.

“Tome-Açú testemunhou em menos de uma semana atentados contra quatro lideranças indígenas que foram alvejadas com tiros e sangram na luta pela defesa de seus territórios”, destaca a nota pública sobre o episódio.

O documento ressalta ainda que “nesse momento fica o questionamento: quantos indígenas precisam ser baleados ou morrer para chamar a atenção dos órgãos públicos para a responsabilização dos culpados pelos atentados e para garantir a proteção das comunidades indígenas do Alto Acará?”.

A nota também afirma que “diante, da gravidade da situação e destes recorrentes ataques, exigimos que sejam tomadas providências urgentes no sentido de investigar e apurar rigorosamente estes crimes, com a devida responsabilização dos culpados. Também, exigimos que o governo estadual e federal adote as providências para a solução do conflito territorial existente, garantindo e resguardando os direitos das comunidades indígenas, quilombolas e ribeirinhas. É necessária a intervenção da Polícia Federal”.

Acompanhe aqui a nota da Associação Tembé na íntegra.

Empresa nega a versão apresentada pelos indígenas

Em nota ao Carta Amazonia, o Grupo Brasil BioFuels negou a versão apresentada pelas lideranças Tembé e informou que o Polo de Tomé-Açu, propriedade privada da empresa, composto pela Agrovila, Administração Geral e Áreas de Infraestrutura, foi “invadido e teve equipamentos incendiados e edificações destruídas por invasores indígena”.

Imagens do conflito ocorrido nesta segunda-feira, 07, em Tomé-Açu (Vídeo: circuito interno/Grupo BBF)

Segundo a companhia, cerca de 30  homens armados “ameaçaram e agrediram trabalhadores da empresa, antes de incendiar dezenas de tratores, maquinários agrícolas e edificações”. A nota informou ainda que a equipe de segurança privada da companhia conseguiu conter a ação criminosa e resguardar a vida dos trabalhadores que estavam no local.

Acompanhe aqui a nota da empresa na íntegra.

O grupo BBF afirmou que já registrou mais de 850 boletins ocorrências nos últimos dois anos em relação a esses conflitos. Nos boletins são relatados roubos, furtos de dendê, incêndios criminosos, agressões contra trabalhadores e tentativas de homicídios. A companhia destaca ainda segue prestando todo o apoio jurídico, de evidências e esclarecimentos necessários aos órgãos de segurança pública do Estado do Pará com o objetivo de uma rápida solução dos casos recentes.

Conflito territorial

O episódio desta segunda-feira é mais um caso do conflito territorial envolvendo indígenas Tembé e o Grupo Brasil BioFuels. A companhia é fornecedora de óleo de palma para gigantes do setor energético (usado para a produção de biodiesel) e para o setor alimentício. De acordo com dados divulgados no site da empresa, a BBF possui no Pará cerca de 56 mil hectares de plantações de dendê e sua planta industrial tem capacidade de processar 285 toneladas de frutos frescos por hora. Além do Pará, o grupo também atua nos estados do Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima.