Delegação Indígena da organização Engajamundo solicita maior representação dos povos originários nos espaços de tomada de decisão, como as Conferências Climáticas da ONU, onde as vidas e o futuro do planeta são negociados
O financiamento para as questões climáticas segue como a principal pauta da 29ª Conferência Climática da ONU (COP29), em Baku, capital de Azerbaijão. Além de reunir chefes de Estados de várias partes do mundo, o evento, que iniciou na última segunda-feira (11) e segue até o dia 22 de novembro, também conta com a participação de diversas lideranças indígenas do Brasil, que acompanham de perto os debates sobre financiamento adequado para a crise climática.
“Nós buscamos o protagonismo nas discussões ambientais, evidenciando que não há futuro sustentável sem a participação ativa dos povos indígenas”, afirma Avanilson Karajá, da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab). Ele enfatiza a urgência de interromper o uso de combustíveis fósseis, mesmo em países petroleiros como Azerbaijão e Emirados Árabes Unidos, locais das COPs recentes.
A reivindicação da liderança da Coiab também é compartilhada pelos jovens indígenas Cleo Nascimento, Jarê Aikyry, Paulo Galvão e Samuel Arara, da delegação do Engajamundo, organização apartidária e sem fins lucrativos, que há 11 anos participa das Conferências Climáticas da ONU. Segundo eles, existe uma necessidade urgente de maior representação dos povos originários nos espaços de tomada de decisão, onde as vidas e o futuro do planeta são negociados.
Cleo Nascimento, que integra o time de comunicação da delegação, é nascida e criada nas terras indígenas Pankararu, na cidade de Tacaratu, no sertão pernambucano. É biomédica, especialista em gestão em saúde e em saúde digital, mestre e doutora em Ciências e pesquisadora na área de poluição do ar, saúde humana e clima. Ativista socioambiental, desenvolve trabalho de comunicação popular e divulgação científica, visando a democratização da ciência e o fortalecimento da educação ambiental e climática.
Jarê Aikyry é um jovem trans, originário da TI Kuanã, rio Cuieiras, Amazonas e atua no time de ativismo. Atualmente é um dos Diretores Executivos do Engajamundo e coordenador do coletivo de indígenas LGBTQIA+ do Amazonas – Miriã Mahsã. Trabalha há, pelo menos, 7 anos com a intersecção entre raça, gênero e mudanças climáticas, atuando e influenciando diretamente nas negociações sobre Adaptação dentro da UNFCCC. Ativista socioambiental, Jarê luta pela defesa dos povos e territórios – indígenas e de comunidades tradicionais – e pelos direitos de jovens LGBTQIA+.
Paulo Galvão, natural da região do Baixo Tapajós em Santarém, no Pará, é ativista indígena, climático e socioambiental, produtor sociocultural e estudante de Relações Internacionais. Trabalha com juventudes, pautas ligadas ao meio ambiente, povos e comunidades tradicionais e sustentabilidade, pautando a justiça climática, social e racial. É também coordenador do GT de Mudanças Climáticas no Engajamundo, coordenador do Projeto sociocultural e de ativismo Vozes da Amazônia, e trabalha na área de Criança e Natureza no Instituto Alana. Além disso, é também um dos coordenadores da delegação.
Samuel Arara vem do Acre, sendo um dos poucos indígenas do estado a marcar presença na conferência. É ativista, ambientalista e comunicador, com formação continuada em jornalismo socioambiental pela Agência Carta Amazônia. É também acadêmico em Engenharia Florestal da Universidade Federal do Acre (UFAC) e em Tecnologia em Gestão Ambiental na faculdade (Estácio) e integra o grupo de comunicação da delegação do Engajamundo.
Em defesa dos povos e da natureza
Segundo nota divulgada pela equipe de comunicação do Engajamundo, a delegação indígena presente na COP29 é formada por jovens extremamente capacitados, com conhecimento técnico, científico e ancestral, fortalecidos pela força do seu povo e sua origem. Apesar de virem de diferentes povos, culturas e regiões, os quatro partilham entre a si não apenas a descendência, mas a força e a vontade de lutar em defesa dos povos e da natureza.
“A presença desses jovens nas discussões internacionais sobre o clima não é apenas simbólica, mas uma necessidade urgente para a construção de políticas climáticas globais sustentáveis, justas e inclusivas”, destaca a nota.
O documento ressalta que já passou da hora de os povos indígenas e tradicionais serem reconhecidos como lideranças no enfrentamento à crise climática. “Estamos na linha de frente na defesa do meio ambiente, e é chegada a hora de recebermos o que nos é devido por direito. Cobramos por uma transição energética justa e equitativa, que considere as nossas vozes, proteja os nossos os nossos territórios e respeite os nossos direitos. Exigimos que sejamos colocados nos centros dos debates climáticos, que seja nos dado o espaço devido para participar das mesas de discussões e negociar acordos financeiros, políticos e sociais equitativos para restauração dos nossos ecossistemas e preservação das nossas florestas”.
Cleo Nascimento afirma que apesar dos povos originários estarem entre os grupos mais impactados pelas emergências do clima, são eles que mais lutam pela preservação do planeta. “Lutamos diariamente para sobreviver, por representatividade e pelo simples direito de ocupar nosso espaço e nosso lugar de fala. Lutamos não porque gostamos, mas porque somos obrigados. Lutamos porque não podemos ficar parados enquanto nossos direitos são diariamente violados por mecanismos inconstitucionais, a exemplo do Marco temporal. Por isso cobramos por mais investimento financeiro e políticas públicas eficiente para empoderamento das juventudes indígenas, bem como medidas que viabilizem a nossa participação em eventos como a COP29”, destaca Cleo.
A jovem lembra que as contribuições dos indígenas nesses debates trazem uma perspectiva única e necessária, que integram conhecimentos ancestrais com ações ambiciosas focadas na conservação ambiental e sustentabilidade, reconhecendo a importância dos povos indígenas como autoridades na defesa das florestas e da biodiversidade, fortalecendo a cobrança por justiça climática, adaptação e financiamento equitativo e digno à urgência da crise climática.
“Para nós, participar de espaços como a COP29 é uma oportunidade de fortalecer o diálogo com líderes mundiais, nos incidindo politicamente e apresentando soluções que valorizem o conhecimento ancestral e políticas de influência que respeitem e protejam os territórios indígenas. Esse é um momento para exigirmos acordos concretos para mitigação da emergência climática, é um espaço em que esperamos poder cobrar a dívida que o colonialismo deixou. É um espaço para incidirmos e usarmos o espaço que nos foi dado para cobrar o que nos é devido”, explica Cleo.
A nota do Engajamundo, assinada pelos quatro jovens indígenas, reitera ainda que espaços como a COP29 sejam cada vez mais ocupados por juventudes, diversa e empoderada. “Para isso, é essencial o apoio de toda a sociedade, incluindo organizações do terceiro setor, órgãos de fomento e iniciativas de financiamento coletivo. A participação de jovens indígenas em conferências climáticas internacionais não é apenas uma questão de representatividade, mas um ato de valorização do conhecimento tradicional, de preservação da biodiversidade e de construção de um futuro mais sustentável para todos. A presença desses jovens brasileiros na COP reitera a importância de ouvir e incorporar as vozes daqueles que, historicamente, têm preservado os recursos naturais. Em tempos de crise climática, os povos indígenas são guardiões não apenas de suas comunidades, mas do futuro”, finaliza o documento.
Engajamundo
O Engajamundo está presente no Azerbaijão com uma delegação diversa, contando com 13 jovens vindos das cinco regiões do Brasil, garantindo a representatividade de raça, classe e gênero. A delegação apresenta a maior participação de indígenas em 11 edições do Engaja na COP com a presença de quatro jovens indígenas, vindos do Norte e Nordeste.
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Foto de capa: Divulgação / Engajamundo