A maior parte das mentiras disseminadas a respeito da Amazônia está associada a “mitos” de origem colonizadora, inseridos no discurso sobre a região. A afirmação é de um relatório produzido pelo coletivo Intervozes, lançado no último dia 25 de abril. O relatório Amazônia Livre de Fakes, traz o resultado de análise sobre conteúdos de 70 perfis que disseminam desinformação sobre a região nas redes sociais. O assunto é tema do novo episódio do podcast Rede Cidadã InfoAmazonia, que foi produzido pela equipe do Carta Amazônia, veículo de Belém do Pará, parceiro da nossa rede. Este episódio foi dividido em duas partes: esta primeira, traz uma entrevista com a coordenadora executiva do Intervozes, Viviane Tavares; já a segunda, que será publicada no dia 4 de maio, uma entrevista com a jornalista e doutora em Ciências da Comunicação, Vânia Torres.

Ouça aqui a primeira parte do podcast

“A pesquisa mostrou que essas pautas relacionadas à Amazônia ou a desinformação socioambiental ou elas são de fato para reforçar estereótipos, preconceitos e discurso de ódio, ou são disseminadas para serem usados estrategicamente como cortina de fumaça, principalmente a serviço do agronegócio”, destaca Viviane Tavares, coordenadora executiva do Intervozes e uma das entrevistadas do episódio.

O levantamento, realizado pelo Intervozes, de março a setembro de 2022, mostra que a desinformação sobre a Amazônia ocorre a partir da manipulação de determinados assuntos ou notícias falsas relacionadas principalmente à pauta socioambiental. A partir desse mapeamento, foi possível identificar os difusores de desinformação em três grandes segmentos: movimentos sociais de direita, figuras públicas de representação política e canais ou empresas jornalísticas.

Um exemplo desses casos de desinformação socioambiental usada como cortina de fumaça ocorreu durante a repercussão do assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips, em junho do ano passado, na Terra Indígena do Vale do Javari, no Amazonas. Ao mesmo tempo que o assunto ganhava repercussão na imprensa, nas redes sociais cresciam os compartilhamentos da fakenews “Ratanabá, a cidade perdida na Amazônia”.

A história infundada de uma “cidade soterrada, perdida no meio da floresta e que foi a capital do mundo há 450 milhões de anos” ganhou notoriedade no Youtube, se expandiu para grupos de Whatsapp e foi compartilhada por milhares de usuários de redes sociais, entre eles, Mário Frias, ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro, que compartilhou a notícia falsa no Twitter.

“Existe toda uma indústria de desinformação que usa essas notícias falsas de maneira muito estratégica. É interessante ver que essas páginas e portais mapeados pela pesquisa sabem que a desinformação socioambiental tem um propósito porque mobiliza muito as pessoas. E aí a gente tem uma característica particular, reforçada por uma pesquisa da UFRJ, que mostra que a nossa desinformação socioambiental não é a desinformação climática nesse debate internacional. A nossa desinformação socioambiental tem propósitos específicos, que não são só anti-cientistas. Ela apoia o agronegócio, o setor de mineração e o desmatamento. E foi usada também como estratégias de cortina de fumaça em relação aos casos de desmatamento e da política anti-ambiental do governo Bolsonaro”, ressalta a coordenadora do Intervozes.

PL das Fake News

O Projeto de Lei Nº 2630/2020, que cria a Lei Brasileira de Liberdade, Responsabilidade e Transparência na Internet, popularmente conhecido como PL das Fake News, é o protagonista de uma série de polêmicas contra e a favor do combate à disseminação de desinformação na internet. A situação gerou uma disputa de narrativas nas redes sociais e até a reação de Big Techs de posicionando contra o projeto.

A Coalizão Direitos na Rede, que reúne mais de 50 entidades da sociedade civil, inclusive e o Intervozes, divulgou nota pública sobre a importância da aprovação do PL Nº 2630/2020, na qual destaca que “é essencial reafirmar a defesa da regulação pública democrática em um cenário em que forças ligadas a pressões de interesses escusos e/ou ligados às plataformas têm promovido uma campanha baseada em mentiras e distorções para tentar derrotar o projeto (como a mentira de que a proposição censuraria textos religiosos). O interesse de quem não quer obrigações republicanas é ter um espaço livre para difundir ódio”.

O PL já passou pelo Senado Federal e chegou à Câmara Federal para votação na terça-feira (3), mas foi retirada de pauta após solicitação do relator, o deputado Orlando Silva (PC do B – RJ), e está sem prazo para voltar à pauta da Casa.

Rede Cidadã InfoAmazonia

A Rede Cidadã InfoAmaazonia desenvolve reportagens e podcasts voltados para agenda socioambiental pautada por mídias sediadas na Amazônia que produzem conteúdo independente, crítico e analítico sobre a Amazônia e seus povos. Atualmente, são parceiros da Rede: Tapajós de Fato, de Santarém, no Pará; site O Vocativo, de Manaus, no Amazonas; Agência Experimental de Jornalismo, do Macapá, no Amapá; Agência Tambor, de São Luís, no Maranhão; e a Carta Amazônia, de Belém, no Pará.


Texto de autoria do jornalista Adison Ferreira, coordenador do Carta Amazônia (membro da Rede Cidadã InfoAmazonia).