Pesquisadores do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais (Cemaden), unidade de pesquisa vinculada ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), apontam que a seca extrema na Amazônia deve durar pelo menos até dezembro deste ano, quando o fenômeno El Niño atingirá a sua intensidade máxima. Até lá, as previsões de chuva do Cemadem indicam volumes abaixo da média.

O aquecimento anormal do Oceano Atlântico antecipou o início da estação seca, produzindo uma estiagem extrema que está secando alguns dos principais rios amazônicos em um ritmo inédito, multiplicando queimadas e aumentando as temperaturas acima do normal. A estiagem é mais grave na Amazônia Ocidental, que compreende os estados do Acre, Rondônia, Roraima e Amazonas.

Desde maio, parte desses estados vem registrando chuvas abaixo da média. De acordo com o Cemaden, a situação pode ser uma consequência do inverno mais quente provocado pelo El Niño. Os pesquisadores afirmam que o déficit de chuvas registrado entre os meses de julho e setembro no interior do Amazonas e no norte do Pará foi o mais severo desde 1980.

Em grande parte do Amazonas, Acre e Roraima, observa-se uma anomalia de chuvas de -100 a -150 milímetros. Devido ao déficit acumulado de precipitação, a umidade do solo alcançou níveis críticos ao longo do mês de setembro”, informou o órgão.

Agravamento da seca a partir de outubro

Ao mesmo tempo, o forte El Niño previsto para este ano deve se intensificar a partir de meados de outubro, agravando e prolongando os efeitos da seca, que tendem a se alastrar por outras partes do bioma. Se o aquecimento anômalo do Atlântico permanecer, segundo os especialistas, a seca extrema na Amazônia poderá se prolongar até a metade de 2024.

De acordo com o diretor de Conservação e Restauração do WWF-Brasil, Edegar de Oliveira, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) tem alertado há anos para o aumento da frequência de eventos extremos como a seca que assola a Amazônia.

“A combinação de mudanças climáticas e desmatamento desenfreado contribui para o agravamento e prolongamento da seca, que, por sua vez, leva ao aumento das queimadas, o que tende a exacerbar ainda mais os efeitos da estiagem, afetando o regime de chuvas. Isso impacta não apenas na vida dos povos locais, mas também a economia e a segurança hídrica de outras regiões, pois o que acontece na Amazônia interfere nos demais biomas”, explica.

Municípios decretaram estado de emergência

Caso as previsões se confirmem, com a seca se agravando em outubro, os rios Negro, Solimões, Purus, Madeira e Amazonas devem ter, ainda em 2023, a maior seca da história, superando a de 2005, quando faltaram alimentos, combustível, energia e água em inúmeras localidades. Houve outras estiagens severas em 2010, 2015 e 2016, mas em nenhuma delas o aquecimento do Atlântico foi tão pronunciado.

Esse cenário catastrófico já está se desenhando na Amazônia, com cidades inteiras, cujo acesso só se dá pelos rios, correndo o risco de ficar isoladas. Em diversas localidades os rios já estão intransitáveis, impossibilitando o transporte de alimentos e medicamentos e o abastecimento de água.

Mais de cem botos vermelhos e tucuxis apareceram mortos no lago Tefé (AM), desde o dia 23/09. A principal hipótese das mortes é a seca dos rios acima dos padrões já registrados e a alta temperatura da água (Foto: Miguel Monteiro / Instituto Mamirauá)

Cerca de 500 mil pessoas já estão sendo afetadas na região. A pior situação é a do Amazonas, onde 55 dos 62 municípios decretaram estado de emergência. O governo do estado estuda a possibilidade de remover comunidades inteiras que vivem da agricultura familiar nas áreas de várzea dos principais rios por conta das mudanças no clima da região.

Também foi decretado estado de emergência em Rio Branco, no Acre – onde já há falta de água potável e a produção rural despencou. Porto Velho, em Rondônia, decretará estado de emergência nos próximos dias, caso não haja uma recuperação do rio Madeira, cuja queda de nível já bateu todos os recordes históricos nos últimos meses. Em Rondônia e Roraima usinas hidrelétricas já tiveram suas atividades suspensas por causa do baixo nível dos rios.

A seca também está afetando a agropecuária: na região dos rios Araguaia e Tocantins, no Pará, os pastos perderam a cobertura vegetal e há registros de mortes de bovinos. Segundo o Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), 79 municípios da Região Norte tiveram mais de 80% de suas áreas agrícolas impactadas pela seca.

A seca extrema da Amazônia chamou a atenção da sociedade brasileira e mundial após a divulgação pela imprensa da morte de pelo menos 125 botos cor-de-rosa e tucuxis no lago Tefé, na região do médio rio Solimões, no Amazonas, onde as águas chegaram a 40 graus – 10 acima da média registrada historicamente.

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Com informações da organização não-governamental WWF Brasil

Foto de capa: André Coelho / Instituto Mamirauá