Encontro tem a finalidade de elaborar a primeira NDC Indígena, uma proposta inédita que estabelecerá compromissos climáticos específicos dos povos originários. Evento segue até quinta-feira, 5 de junho

Representantes de povos originários de nove países da Bacia Amazônica participam, entre os 2 a 5 de junho, em Brasília, da Pré-COP Indígena. O encontro, promovido pela Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), marca o lançamento da primeira Comissão Nacionalmente Determinada (NDC) indígena, uma proposta inédita de contribuição climática construída a partir das visões, experiências e soluções dos povos indígenas.

A demarcação de Terras Indígenas é um dos eixos centrais das discussões da NDC, que será construída coletivamente durante o encontro. O texto final será entregue ao presidente da COP30, embaixador André Corrêa do Lago, e servirá como base para as negociações com o governo brasileiro.

“Estamos diante do colapso climático e da destruição dos nossos territórios. A NDC Indígena é uma resposta coletiva ao sistema que insiste em ignorar quem protege a floresta há milênios. A Amazônia está no limite do ponto de não retorno”, afirma o coordenador geral da COIAB, Toya Manchineri.

O chamado indígena acontece em um contexto de intensos ataques à floresta e aos povos que nela vivem – como a mineração em terras indígenas, exploração de petróleo e gás e suspensão de processos de demarcação já em andamento. Recentemente, o Senado brasileiro aprovou o ‘PL da Devastação’ (2.159/2021), que flexibiliza o licenciamento ambiental no país e retira a proteção aos territórios indígenas ainda em processo de demarcação, favorecendo, na prática, o avanço de atividades como mineração e agronegócio.

“O PL da Devastação é apenas o mais recente de uma série de ataques. Seguimos resistindo com firmeza ao Marco Temporal. Enfrentamos um Congresso determinado a abrir nossas terras à exploração desenfreada. O mundo precisa compreender, de uma vez por todas: proteger os povos indígenas e seus territórios é proteger o equilíbrio climático do planeta. A demarcação das terras indígenas deve ser reconhecida como uma política climática estratégica – com metas claras e financiamento direto. Liderança climática se constrói com ações reais, não com promessas vazias. O tempo da espera acabou”, reforça Manchineri.

Para Patricia Suarez, da Organização Nacional dos Povos Indígenas da Amazônia Colombiana (OPIAC), o momento é decisivo: “A pré-COP indígena amazônica é um marco histórico. Não estamos aqui apenas para sermos ouvidos – exigimos ser reconhecidos como protagonistas na construção de soluções climáticas efetivas. Nossos territórios, nossos conhecimentos e nossas formas próprias de governança não são complementares: são fundamentais para enfrentar a crise climática global. Diante da ameaça real da Amazônia se aproximar perigosamente de um ponto de não retorno, é inaceitável que nossas vozes sigam sendo tratadas como periféricas. Os povos indígenas são guardiões da maior floresta tropical do planeta – ignorar nosso papel é comprometer o futuro da humanidade. Exigimos que nossas delegações ocupem posições de liderança nos espaços de negociação e decisão na COP30. Queremos diálogo direto com governos e organismos multilaterais. Não há justiça climática sem protagonismo indígena.”

Preparação para a COP30

O encontro em Brasília marca um esforço de fortalecimento da diplomacia indígena em escala global. Na reunião, que tem a finalidade de ser um evento preparatório para a 30ª Conferência do Clima, em novembro, as lideranças também buscam articular estratégias para conferências futuras, como a COP31, que pode ser realizada na Austrália.

Além da Coiab, a Pré-COP Indígena conta ainda com a participação de diversas organizações indígenas, incluindo a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) e a coalizão G9 da Amazônia Indígena.

A NDC Indígena deve ser apresentada na Conferência de Clima de Bonn, que acontece em meados deste mês na Alemanha.

Comissão Indígena para a Conferência do Clima

A Pré-COP é mais uma ação do protagonismo indígena nas negociações climáticas da Conferência do Clima 2025. Em abril deste ano, durante a programação do Acampamento Terra Livre (ATL), em Brasília, as lideranças lançaram oficialmente a Comissão Internacional Indígena para a COP30. A comissão é presidida pela ministra Sonia Guajajara e composta por seis organizações: APIB, Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (Anmiga), Aliança Global de Comunidades Territoriais (GATC), Fórum Permanente da ONU sobre Assuntos Indígenas (UNPFII) o G9 da Amazônia Indígena – uma coalizão internacional formada por líderes de organizações indígenas dos nove países amazônicos

Criada conjuntamente com autoridades do governo federal, a comissão tem como finalidade desenvolver uma metodologia para garantir o credenciamento de povos indígenas para a Conferência como prática institucionalizada para futuras COPs; assegurar que haja foco em prioridades específicas dos povos originários; conduzir reuniões regionais; e planejar e executar eventos e reuniões com Estados-partes, agências da ONU e aliados, com o objetivo de ampliar as demandas dos povos.

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Com informações da jornalista Valdeniza Vasques, da Coiab

Foto de capa: Pepy Põocatëyë/ Coiab