Manifestação chega ao 14º dia sem negociação. Ministra destacou que pretende dialogar com o governo do Pará e outros ministérios sobre a solicitação dos indígenas, mas destacou que decisão final sobre a revogação da Lei 10.820 cabe ao governo estadual
Centenas de indígenas que ocupam a sede da Secretaria de Educação do Pará, em Belém, receberam nesta segunda-feira, 27/01, a visita da ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara. No encontro, os manifestantes apresentaram as pautas de reivindicações do movimento e pediram a revogação da Lei 10.820, a exoneração do secretário estadual de Educação, Rossieli Soares e a presença do governador Helder Barbalho (MDB) na ocupação.
A nova legislação, aprovada em votação fechada em dezembro do ano passado – e marcada pela repressão da Polícia Militar, que usou balas de borracha e spray de pimenta para conter professores que protestavam contra a medida –, altera o plano de gratificações do Sistema Modular de Ensino (Some) e do Sistema Modular de Ensino Indígena (Somei).
Segundo as lideranças, somente após a revogação da nova legislação é que será possível discutir de forma ampla a proposta de uma lei estadual voltada para educação indígena.
Depois de ouvir as reivindicações, Sônia Guajajara destacou que pretende dialogar com o governo do Pará e outros ministérios sobre a solicitação dos indígenas, mas destacou que decisão final sobre a revogação da Lei cabe ao governo estadual. “A educação indígena é uma prioridade e representa a preservação de culturas, o respeito aos nossos saberes, à diversidade e ao futuro dos povos originários”, afirmou.
Sem avanços na negociação
A manifestação, que também conta com o apoio de Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação Pública do Pará (Sintepp), quilombolas, ribeirinhos e diversos movimentos sociais do estado, denuncia os cortes e mudanças que impactam diretamente nas condições de trabalho dos profissionais de educação do estado. Para as lideranças do movimento, as ações do governo, liderado por Helder Barbalho (MDB), representam um ataque direto à valorização do ensino público.
Na última sexta-feira (24), Helder promoveu uma reunião para discutir uma lei que regula a educação indígena estadual. No entanto, a agenda recebeu críticas do movimento indígena, que afirma não reconhecer qualquer acordo com o governo do Estado referente à educação indígena.
Durante a reunião, o secretário substituto da Secretaria Nacional de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas (Seart), Uilton Tuxá, informou que dois membros do movimento participariam da reunião, mas a informação foi negada pelas lideranças do movimento que ocupam a Secretaria Estadual de Educação.
“Nós exigimos que o governador compareça ao prédio da Seduc para ouvir o nosso movimento, mas ele se recusa. Não queremos discutir apenas parte da Lei, muito menos remendá-la. Nossas reivindicações são simples e diretas, mas parece que o governador se faz de desentendido. Queremos a revogação da Lei 10.820 e a exoneração imediata de Rossieli Soares”, afirma Auricelia Arapiun.
A ocupação do prédio da Seduc ocorre desde o último dia 14 de janeiro. As lideranças reivindicam a permanência do Sistema Modular de Ensino (Some) na educação escolar indígena, que foi alterado recentemente pelo governo sem nenhuma consulta aos povos originários.
Por todo o Pará
Além da manifestação em Belém, o movimento indígena também tem realizado protestos contra a Lei nº 10.820 em diferentes regiões do Pará. Há mais de uma semana manifestantes bloqueiam o quilômetro 922 da BR-163, em Belterra, no oeste paraense. Nesta segunda-feira, o povo Suruí fechou hoje, 27, a BR 153, próximo a São Geraldo do Araguaia, no sudeste do estado, e os indígenas Tuiwara ocuparam a Secretaria Municipal de Educação de Tomé-Açu, nordeste do Pará.
Posicionamento do governo
Em entrevista à TV Liberal, afiliada à Rede Globo, nesta segunda-feira, 27/01, Helder Barbalho afirmou que o governo não pretende acabar com a educação presencial do Sistema Modular de Ensino Indígena (Somei). “Está mantida 100% todas as aulas do Somei. Serão presenciais, garantindo com isso o direito dos povos indígenas do estado”, afirmou.
O governador declarou ainda que a manifestação dos povos indígenas é justa e que eles têm o direito de se manifestarem. Ele também disse que “o governo estabeleceu um pacto com povos indígenas do estado para debater a estratégia da educação indígena além do sistema modular”.
“Pela primeira vez o estado tem a oportunidade de criar a lei estadual de educação indígena, que discute o aperfeiçoamento e a garantia da qualidade educacional. Mas, garante também o bilinguismo nas escolas com todas as suas especificidades, garante que os professores do Somei possam estar recebendo o teto do salário, mais alto nível salarial, 80% de gratificação”, ressaltou Helder.
Some
O Sistema Modular de Ensino (Some) funciona no Pará há mais de 40 anos. A iniciativa é uma modalidade que garante o ensino médio em localidades distantes das sedes municipais. São comunidades onde, segundo o governo estadual, não é possível construir uma escola com toda a estrutura do ensino regular por ter menos alunos.
O sistema funciona como uma parceria, onde o município fornece o espaço e a Seduc é responsável pelos professores, alimentação escolar e outros recursos pedagógicos.
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Foto de capa: Thaigon Arapiun/ Conselho Indígena Tapajós e Arapiuns